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textos sem sentido e outros

domingo, abril 15, 2007

as batalhas e o silêncio

Antes de se alistar como voluntário para a 1ª Guerra Mundial, Wittgenstein procurara afincadamente encontrar as bases da lógica, aquelas que, segundo a sua imodéstia e impertinência, iriam revolucionar a filosofia. Ao longo da guerra e enquanto permaneceu na retaguarda, ocupando funções logísticas, o Tractatus Logico-Philosophicus foi ganhando a forma de um grande livro sobre lógica, linguagem e possibilidades de representação do mundo.
Contudo, após ter participado, a seu pedido, num regimento de artilharia do exército austríaco que combateu na frente russa, perto da fronteira romena, algo se alterou no seu projecto. Em Junho de 1916, a Rússia lança a “Ofensiva Brusilov”, que causou enormes baixas no exército austríaco. No dia 11 desse mesmo mês, as suas reflexões sobre os fundamentos da lógica são interrompidas pela questão: “o que é que eu sei sobre Deus e o sentido da vida?” A partir desse dia, os apontamentos de Wittgenstein começam também a abranger questões relacionadas com o sentido da vida, a ética e a estética, questões que viriam a ocupar as últimas proposições do Tractatus.
Tal como os fundamentos da lógica não podiam ser ditos mas apenas mostrados, assim também o sentido da vida não podia ser dito mas apenas mostrado na linguagem.
Estes pequenos desvios darão ainda mais pertinência à bem conhecida injunção com que termina o Tractatus:
“As minhas elucidações são elucidativas pelo facto de que aquele que as compreende as reconhece afinal como falhas de sentido, quando por elas se elevou para lá delas. (Tem que, por assim dizer, deitar fora a escada, depois de ter subido por ela).
Tem que transcender estas proposições; depois vê o mundo a direito.
Acerca daquilo de que se não pode falar, tem que se ficar em silêncio.”
Esta injunção foi feita para ser respeitada, não em relação ao silêncio, mas em relação à compreensão de que há coisas que pura e simplesmente não se conseguem dizer.
Mas isto não é uma regra, por mais imperativa que possa parecer. Na vida como na blogosfera exigimos palavras sem sentido, pois são elas que, por entre batalhas, nos vão mostrando o sentido.