levante

textos sem sentido e outros

segunda-feira, maio 08, 2006

os crepúsculos

Saltamos, é o que devemos fazer. Só não percebo se saltamos por dever, no sentido moral, ou se o fazemos porque algo nos impele, numa imanência que tanto pode ser da fé ou do instinto. Ou simplesmente porque sim, numa reafirmação constante da humanidade em nós. Como se nos fosse possível realizar a humanidade em nós... Saltamos, ou pelo menos movemo-nos entre a luminosidade e a escuridão, trazemos as noites para os dias e pintamos os dias com o negro do absurdo, o que também é uma arte, uma poiesis, uma forma de fazer mundos.
Mas não consigo deixar de me espantar com a fatal proximidade que une o absurdo e o riso, fatal, sobretudo, quando ambos se fundem num ponto sem fuga e sem quaisquer buracos por onde a luminosidade possa penetrar. Aí sim, sem crepúsculos, não nos restaria senão uma lenta agonia no sem fundo. Mas saltamos, é o que podemos fazer. E os dias, com todo o seu jogo de luminosidades dão uma ajuda tremenda. As manhãs arrancam-nos do escuro, os interstícios são os pontos de fuga por onde subimos e sorrimos, não sei se donos do nosso lugar, firmes nas fundações que suportam as paredes de casa, se planando num tapete voador de uma fábula das mil e uma noites.