levante

textos sem sentido e outros

quarta-feira, março 01, 2006

liberdade canina

Tenho um cão que não gosta de portas fechadas. Assim que se vê enclausurado num qualquer espaço da casa, sem possibilidade de saída, começa a ficar irrequieto; sobretudo se algo de anormal se passa no seu mundo de cão, mundo que imagino cheio de ameaças e grandes afrontas territoriais. Sei que isto é estúpido e corresponde a uma estúpida tendência da “raça” humana para antropomorfizar os outros animais, mas de cada vez que o meu cão se revolta contra as portas fechadas, não consigo deixar de pensar que ele está a montar todo um complexo sistema metafísico acerca da liberdade, qual Sartre de quatro patas. Vejamos: A liberdade é ter portas abertas, ainda que essas portas não possam deixar de estar inseridas numa casa em que crescemos e/ou habitamos. A casa tem paredes que limitam o nosso campo de acção. Quando não existem portas abertas ladramos, e se necessário revoltamo-nos com vorazes mordidelas contra o sistema doméstico que nos oprimiu. Quando as portas estão demasiado tempo abertas, perdemos o sentido da liberdade, esta deixa de ter um referente a que se opor, e esparramamo-nos sobre o confortável tapete que nos preparam todos os dias como forma de atordoar os nossos instintos.