levante

textos sem sentido e outros

terça-feira, dezembro 09, 2003

Debilidades

No dia 5 de Dezembro assisti a uma conferência de/com Gianni Vattimo, conceituado filósofo italiano que se insere na linha da pós-modernidade. Percursor do “pensamento débil”, procura lidar com a herança de Nietzsche e Heidegger, fazendo ao mesmo tempo a ligação com as consequências sociais e políticas que essa “nova” forma de pensamento pode suscitar. A conferência foi bastante esclarecedora e serviu, pelo menos, para que eu pudesse limar algumas arestas em relação à pós-modernidade (expressão que, como referi num post anterior, não gosto de usar e me parece muitas vezes ser um campo de inócuas masturbações intelectuais).
Já no exterior da sala, o sorridente e humorado filósofo disse que temos que ser nós, mediterrânicos, a salvar isto... Estava a brincar, é claro, e obviamente não sabe o quão alheados da vida cívica e política estão os portugueses (algo que não acontece de forma tão marcada na Itália – apesar do fenómeno Berlusconi).
Mas depois, agora, ponho-me a pensar: já existe um pensamento filosófico aglo-saxónico e um pensamento filosófico continental, sendo o primeiro mais pragmático e empirista e o segundo mais ontológico e metafísico. Porque não inaugurar um pensamento mediterrânico, uma terceira via em que finalmente o sangue e o calor entrem na filosofia? Porque não aproveitar o sol e colocar definitivamente o prazer como a consequência inevitável de todas as nossas acções e teorias? E uma filosofia do levante, dos ventos de dentro que aquecem os corações dos amantes sob as águas tépidas do mar? E um pensamento das paisagens queimadas e estropiadas pelo homem, dos homens encostados às encostas das costas, da áfrica afunilando clandestinos pelo estreito do desespero, do turismo de postal como consequência última de um mundo que vai deixando de saber o que são diferenças humanas e culturais? E uma poesia de cristais de palavras, e palavras do tamanho de dedos, e dedos do tamanho dos olhos, e olhos da altura das cores, e arco-íris a ligar os planetas, e sonhos de leite e mel, e todos os conceitos se esvaem, todo o sangue jorra para dentro de um chão aberto e dobrado e confiscado pela mentira de ser sólido, e tudo se acalma, e todos os rostos se inclinam para o meu e dizem, cala-te!
Ah, e é tão difícil pensar quando pensamos que o sabemos fazer... Debilidades, masturbações.