levante

textos sem sentido e outros

sábado, setembro 20, 2003

Se hoje alguém parecido comigo tivesse saído de casa a pedalar, lentamente, em direcção a uma praia que se estendesse por um indefinível quilómetro de bruma, saberia que o levante também se esgota, e com ele o verão que vaza a alma das pessoas. Saberia também por que razão as gaivotas planam em círculos irregulares e fingem ser abutres à espera da morte, pressentindo o final de tarde sob o debandar envergonhado das esteiras.
Se alguém, enfim, se sentasse perto do sítio onde me finjo sentar, saberia que a areia não treme com os passos das mulheres e dos homens, mas sim com as pegadas que estes deixaram na memória solúvel do mar.
Talvez fechasse os olhos, esquecendo a falsa e pretensiosa solidão, acreditando que a mulher gorda, sentada no degrau escavado pelas ondas, fosse a encarnação da felicidade.